PROFESSOR OBJETO

Leciono na Rede Estadual de Pernambuco há doze anos. Desde que ingressei no ensino público venho colecionando decepções e dissabores. Não bastasse o vergonhoso fato de receber o pior salário do Brasil, vejo agora, entristecido, que a situação dos docentes aqui em Pernambuco caminha para um desfecho que certamente não será feliz.

A escola em que eu estou lotado foi transformada em “escola de referência” e experimentou, em um primeiro momento, o regime de ensino semi-integral. Assim como eu, vários professores não puderam se candidatar a uma vaga porque tinham outras ocupações, afinal, não dá para viver com o vergonhoso salário que nós ganhamos. Para que os professores do quadro não perdessem o direito adquirido de trabalharem na escola em que foram lotados após prestarem concurso público, muitos migraram para o “Projeto Travessia” que trabalha com correção de fluxo.

Não foi fácil, uma batalha foi travada e a direção da escola conseguiu manter o contingente de professores efetivos que foi distribuído em várias turmas. Viajamos duas vezes cumprindo os períodos de capacitação previstos para os dois primeiros módulos. Agora, qual não foi a nossa surpresa, durante as férias, recebemos a notícia que todos os professores efetivos seriam impedidos de continuar no Travessia.

Pela segunda vez, nós teremos que brigar para continuarmos lecionando no local em que fomos legalmente lotados. Inconformados com a situação, os prejudicados, obviamente, começaram a se mobilizar e protestar. Vários professores contratados entenderam que essa mobilização era contra eles. Muitos reagiram com frases sarcásticas e acusações infundadas aos professores efetivos. A professora Silvana Barros, depois de ler a convocação que os professores do Amaury de Medeiros estavam fazendo, me enviou um e-mail que dizia o seguinte:

NA REALIDADE ACREDITO QUE A CULPA É DE ALGUNS PROFESSORES QUE NÃO CUMPRIRAM SUAS OBRIGAÇÕES E DA DEMANDA DE PROFISSIONAIS NAS ESCOLAS. RECLAMAR NÃO ADIANTA AGORA, JÁ QUE ORDEM FOI REPASSADA P/ SER CUMPRIDA. QUE TAL VC FALAR DIRETAMENTE COM O SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO?”

Recebi vários outros e-mails com tons menos agressivos, mas, que na essência, comungavam com o discurso acima. Criou-se um clima de animosidade que não deveria existir. Contratados ou concursados, somos todos professores, ninguém questionou isso. O que todos nós estamos questionando é a legalidade do ato (sumário) que está substituindo professores que prestaram concurso – e por isso têm direitos adquiridos – por profissionais contratados.

Todo mundo sabe o quanto custa a um professor encontrar uma escola próxima de sua residência e que tenha carga horária disponível. A questão do horário é outra complicação porque, como acentuei acima, todos nós temos outros empregos para poder vivermos com um pouco mais de dignidade. Nada disso é levado em conta por quem tem o poder de decidir.

Aos professores, que estão sendo tratados como objetos que podem ser mudados de lugar a qualquer hora, resta lutar e enfrentar com dignidade as acusações infundadas, as frases sarcásticas e os atos arbitrários.

Comments

6 Responses to “PROFESSOR OBJETO”

Bete Meira disse...
17 de janeiro de 2011 às 01:37

Leciono na Rede Estadual há quase 23 anos e nunca vi tanta imposição e arbitrariedade por parte do Governo em relação às escolas e aos professores.Não há palavras que descrevam o absurdo dessa situação! Quanto à reação de alguns contratados, que tal se inverterem os papeis e se puserem no lugar dos efetivos? Será que achariam justo ter feito concurso público, escolher uma escola próxima de casa, boa de trabalhar e de repente, por uma imposição do governo, simplesmente ser tirado de lá para se lotar sabe Deus onde,deixando para trás um trabalho em andamento? Cedendo seu lugar de direito a um professor contratado, temporário? Gente, vamos dar a César o que é de César. O governo não está sendo justo nem correto? Mas por que não estou supresa? Aos colegas atingidos ofereço minha solidariedade, meu apoio e minhas orações.

Sidclay disse...
17 de janeiro de 2011 às 02:17

É sempre bom a gente se perguntar, a quem interessa essa animosidade, eu sempre acho que no serviço público, esses problemas são fomentados... e beneficiam sempre alguém...

17 de janeiro de 2011 às 13:47

Saudações Amigo!

Concordo plenamente com seu artigo "Professor Objeto". Infelizmente estamos vivendo um momento de políticas públicas educacionais que visam apenas ao interesse de políticos que afirmam ter compromisso com uma educação de qualidade, mas na prática prevalecem os seus interesses pessoais e partidários, e o pior: a populaçã acredita cegamente nas propagandas enganosas que são veiculadas pela mídia.
Realmente, não bastasse o pior salário do Brasil que, diga-se de passagem, tem-se dito na mídia que estamos recebendo o piso instituído por lei federal (grande engano!, pois o que aconteceu foi nada menos que uma incorporação de valores como gratificações e outras vantagens conquistadas com muita luta e o pior: nem sequer a atualização de valores instituída pela própria lei nos foi dada), agora, além de tudo isso e o que foi dito por você no artigo, temos que nos submeter às humilhações e aos constrangimentos por não termos o nosso direito de continuarmos nas escolas onde fomos lotados, conquista essa alcançada por muito suor e esforço, pois, afinal, estudamos bastante para chegarmos a passar no concurso público e sermos estatutários.
Fico infinitamente surpreso com o discurso da professora Silvana, pois o que esta posto em questão não é a competência ou a habilidade docente, mas sim o jogo imposto pelo Governo em que todos nós somos jogados uns contra os outros, contratados e efetivos, efetivoe e efetivos, professores e sociedade, apenas por mero interesse político de fazer não sei a quem acreditar que os números apresentados em relação às escolas de referência refletem realmente algum tipo de melhoria na qualidade da educação.
O mais decepcionante é perceber que nossa amiga, não sei por qual motivo, pois como pessoa esclarecida que é, aceita, ainda, o famoso discurso de que temos que aceitar tudo o que nos é imposto, isso nos relembra a ditadura, não é verdade?
Acredito que ele tenha motivos bem pessoais, mas esperemos que entenda que está sendo apenas mais uma peça (um "professor objeto") nas mãos desses que se dizem governar para o povo.
Gostaria apenas de relembrar o que foi dito no discurso de posse de nossa presidente, Dilma, em que a mesma assumiu que, enquanto o professor não for tratado e reconhecido como a autoridade máxima, a educação não caminhará rumo ao sucesso.
Mas como falar em sucesso se não temos ao menos o mínimo respeito de sermos tratados com dignidade?
Espero, sinceramente, caro amigo Edvaldo, que não fiquemos mais uma vez de braços cruzados. Que de alguma forma nossas reflexões ressoem de alguma maneira promovendo ações.
Ficaria imensamente feliz se esse nosso pequeno gesto de postar artigos e comentários em blogs de qualidade como o seu, ao menos, servisse de ponto de partida para uma luta de mãos dadas entre professores e comunidade escolar e, quiçá, com toda a sociedade. Afinal de contas uma sociedade que não forme cidadãos conscientes de seus direitos e deveres, capazes de interagir efetivamente com seus diversos contextos sociais, dificilmente alcançará o tão sonhado status de país desenvolvido, pos isso só será possível quando a educação for tratada como deve ser: com respeito e total prioridade política e governamental.
Parabéns pela iniciativa e por sua inteligência de sempre redigir textos de excelente teor.
Um abraço do amgigo e companheiro de profissão, Luiz Santana.

PS. Deixo dois pensamentos que julgo serem pertinentes e que, se não me engano, são de Martin Luther King:

(1)O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons.

(2)É melhor tentar e falhar, que preocupar-se e ver a vida passar.
É melhor tentar, ainda que em vão que sentar-se, fazendo nada até o final.
Eu prefiro na chuva caminhar, que em dias frios em casa me esconder.
Prefiro ser feliz embora louco, que em conformidade viver

Bete Meira disse...
17 de janeiro de 2011 às 14:14

Sid, seu comentário me faz perguntar novamente: por que o governo insiste em que o Travessia seja formado apenas pelos contratados? Ninguém me deu uma resposta satisfatória. Se há na casa professores suficientes, o que justifica esse gasto extra? Parece um jogo de cartas marcadas. Será que criaram um novo cabide de empregos? Se há déficit de professores, que seja feito concurso público e não essa enxurrada de contratos que se repete a cada ano!Faço coro com você: quem está sendo beneficiado por isso?

ED CAVALCANTE disse...
17 de janeiro de 2011 às 15:10

É isso, Sid, criou-se uma situaçãode desconforto que,aparentemente, está beneficiando alguém. Luiz, meu nobre, brigado pela deferência e desejo sorte a você na nova cidade e na nova escola.

Abraço!

Sidclay disse...
18 de janeiro de 2011 às 16:47

Pois é, quando vejo esse problemas eu costumo fazer essa pergunta a quem está dentro do processo, infelizmente e normalmente os professores parecem não se questionar e entram fácil no conflito...

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