Numa
publicação da National Geogaphic, assinada por Erla Zwingle, a
antropóloga grega Nadina
Christopoulou, em poucas palavas, destrói o mito da Grécia gloriosa
que sempre se sobrepõe à dura realidade atual do seu país: “Somos
um povo atormentado, a maior parte de nossa memória social gira em
torno da Grécia gloriosa do passado, da perda desse poder, da culpa
que jogamos nos 400 anos de ocupação turca e do que poderia ter
acontecido se não fosse a intervenção da Turquia. Acho que temos
um apego nocivo e muito peculiar ao passado. A adoração, a devoção
à antiga Grécia. Os italianos não têm isso (em relação à Roma
Antiga).”
Essa
preciosa observação de Nadina, por analogia, se aplica a várias
outras situações. A paixão incontida – síndrome de Estocolmo,
para alguns – que muitos recifenses nutrem pelo passado holandês
da cidade se assemelha à paixão grega pelo seu passado
glorioso. Até mesmo a culpa pelo atraso atual que eles atribuem aos
quatro séculos de ocupação turca tem sua versão aqui. Dizem os
mal informados: “Se os holandeses não tivessem sido expulsos,
estaríamos em outro nível”. Penso sempre: Seríamos um Suriname, então?
Outro
exemplo: vários times do futebol brasileiro, que tiveram um passado
glorioso, sobrevivem hoje da lembrança desse passado. O que mantém
essas equipes vivas é a esperança de, ao menos em algum momento,
reeditar alguma dessas glórias. Usar o passado para
sustentar – mesmo de forma precária – o presente é um equívoco
inominável. Impede uma possível renovação, uma tomada de atitude.
Com os times de futebol é fácil resolver isso. Muitos, atualmente,
estão se convertendo em empresas e o passado está deixando de ser
mais importante que o futuro.
Já
com os países o problema perdura porque existe o apego à cultura e à herança do povo. Na Grécia, por exemplo, aceitar que o passado
glorioso não agrega quase nada de bom ao presente seria como ter que
deletar uma parte da própria história. Isso não seria
interessante. O passado, sabemos, é importante para se compreender o
presente. Ele, entretanto, não pode ser mais importante do que o
momento atual. Esse anacronismo funciona como uma enorme âncora que segura as mudanças.
Os
gregos chegam ao ponto de fingir uma origem étnica pura, sem
miscigenação. O fato de se colocar a não-miscigenação como
uma possível “pureza étnica”, inevitavelmente, remete-nos aos
delírios racistas de Adolf Hitler. Mais: o purismo étnico alegado
pelos gregos, geneticamente falando, representaria uma fraqueza pois
é sabido que uma raça miscigenada se fortalece, torna-se mais
resistente. Esse elementar ensinamento da biologia sempre foi
riscado das cartilhas de quem se esforçou em proclamar supremacia de
uma raça sobre outra. A tal da cegueira providencial.
Encerro
esse post com a valorosa contribuição de Mário Quintana sobre esse instigante tema:
“O
que me impressiona, à vista de um macaco, não é que ele tenha sido
nosso passado: é este pressentimento de que ele venha a ser nosso
futuro”.