ESCRITOR OU ADAPTADOR?

Na época da escola tive enfrentamentos homéricos com os meus professores de literatura!Tudo porque, nos meus trabalhos, referia-me a Ariano Suassuna como adaptador e não como escritor. Criticar Ariano aqui no nordeste é como falar mal de Maomé em Meca. Meus argumentos eram sempre rechaçados. O grande (e apaixonado) professor Felinto chegou a me expulsar da sala, certa vez.

A dita obra-prima de Ariano Suassuna é o Auto da Compadecida. O texto foi todo baseado em três cordéis: "O Enterro do Cachorro", "O Cavalo que Defecava Dinheiro" e "O Castigo da Soberba". Esses três textos populares são a espinha dorsal dessa famosa obra. Portanto, houve uma adaptação e não uma criação. Cito também a comédia “O Santo e a Porca”. Segundo o próprio Ariano, uma imitação nordestina da peça "Aululária" de Plauto. “A Pedra do Reino” foi inspirada num acontecimento ocorrido em São José do Belmonte (470 quilômetros do Recife) onde uma seita, em 1836, tentou fazer ressurgir o rei Dom Sebastião. Ariano, usando a sua habilidade de adaptador, transformou o fato em livro. Ele também é conhecido pelo radicalismo. Apaixonado pela cultura popular (que ele chama de erudita) tem aversão a estrangeirismo. O episódio mais conhecido desse seu lado xenófobo foi ter se recusado a receber o Prêmio Sharp concedido à adaptação, para a tv, da sua peça “Uma mulher Vestida de Sol”. O argumento: “não quero um prêmio que tem o nome de uma multinacional extrangeira”. Contraditoriamente, Ariano Suassuna deu várias “aulas espetáculo” patrocinadas pela Parmalat.

Não pensem aqui que quero manchar a imagem do velho mestre. Ariano não precisaria ter escrito nada para ter um lugar de destaque na cultura popular. Suas palestras são riquíssimas e revelam a verdadeira alma nordestina. Mas eu deixo algumas perguntas: quem escreveu “O Enterro do Cachorro”, O Cavalo Que Defecava Dinheiro” e “O Castigo da Soberba”? Por que esses artistas nunca são citados? Por que se inspirar nos Beatles é ter mente de colonizado e se inspirar em Plauto é ser cabeça? Só existe cultura popular no Brasil?

Dedico esse post ao excelente professor Felinto , já falecido, com quem tive grandes embates que me enriqueceram muito. Professor, continuo achando que Ariano é uma grande adaptador! rssss

Comments

17 Responses to “ESCRITOR OU ADAPTADOR?”

Bete Meira disse...
9 de novembro de 2008 às 15:51

Como prof de português,não vejo motivo p/ enfrentamentos homéricos por causa da sua opinião.A liberdade de pensamento é fundamental!Amo,admiro e respeito o querido Ariano(meu ex-prof de Estética na UFPE).Suas aulas foram inesquecíveis,eram imperdíveis,eu ficava "babando",não deixava escapar nada do que ele falava.É uma figura única,fantástica... conversar com ele é enriquecedor,ouvi-lo falar não cansa,deixa sempre um gosto de "quero mais". Não vejo pq adaptar obras o desmereceria,afinal ele não faz plágio,mas cita as obras em que se baseia.Mas concordo quando pergunta pq os autores das obras usadas p ele não são citados e creio que foi radical recusar o prêmio Sharp.Mas sendo escritor e/ou adaptador, Ariano é GRANDE!!!Ele poooooooooooooooode!Kkkkkkkkkk

blog disse...
9 de novembro de 2008 às 15:56

A questão é que os escritores têm a desculpa da intertextualidade - ou seja, os diálogos entre os textos. Claro, claro: todos sabem que, assim como homens vêm de outros homens, textos nascem de outros textos, mas o que vc questiona é perfeitamente lícito. O próprio personagem João Grilo nasceu no cordel - e não pelas mãos de Suassuna, que foi ao Jô Soares e posou de criador do personagem. Não é, e alguém precisa dizer isso, até para que o próprio Suassuna não seja acusado, mais tarde, de plagiador.

Quanto à sua xenofobia, acho interessante isso. Deve recusar-se a ouvir Beethoven, a assistir a filmes do Chaplin, a andar de automóveis da GM e a comer lasanha.
Tenha dó!
Cortinas pra ele! (nesse quesito, ao menos)

Abraço.

Bia Nascimento disse...
10 de novembro de 2008 às 13:43

e viva a liberdade nas idéias!!!!
Tenho várias opiniões a respeito de alguns mestres e as vezes prefiro ficar calada do que apanhar...as vezes prefiro apanhar do que ficar calada...Enfim...
As pessoas compram brigas por cada coisa não?!
Acho que o seu pensamente tem muito fundamento e acho absurdo você ter sido expulso da sala de aula, lugar onde deveriamos aprender a discutir sempre respeitando a opinião do próx.

Anônimo disse...
10 de novembro de 2008 às 13:52

A discussão colocada é muito boa. Dividir a cultura em popular, erudita, tradicional e de massa e inegavelmente um equívoco quando pensamos em adaptações como as que Suassuna realizou de obras de cordel. Não é pecado adaptar. Adaptar faz parte da cultura vigente.

Qual é diferença entre adaptar o forró tradicional em "forró universitário"? Será que se as obras de cordel fossem apresentadas à rede Globo tal qual foram escritas teriam virado minisséries? Claro que não pois, para tanto, seria necessário um "refinamento" ou uma adaptação para que o público massivo aceitasse e se identificasse de alguma forma com a obra. Foi o que Suassuna fez. A rede Globo então fez a "adaptação da adaptação".

Tudo isso são técnicas utilizadas pela cultura vigente, que, conforme dito por Edgar Morin é o que se convencionou a chamar de cultura de massa. Quando se diz indústria cultura sobre estes processos não é à toa. É como se fosse uma linha de produção.

Outro erro muito cometido pela academia é crer que só porque é de massa é ruim. Não necessariamente. Prova é caso de Suassuna que mesmo "entrando no jogo", mesmo que inconscientemente, consegue trazer inquietação ao público pela qualidade da sua obra.

Nat Valarini disse...
10 de novembro de 2008 às 14:04

Boa tarde!

Que surpresa maravilhosa encontrar uma postagem como essa.

Confesso que não sabia destes detalhes sobre a obra de Ariano.

Analisando sobre a sua perspectiva, digo que está correto. E acho louvável o questionamento sobre os autores dos cordéis que o inspiraram.

Como você mesmo disse, não queremos desmerecer, mas este é um ponto muito importante e deve ser levado a discussão sensata.

Seu blog é maravilhoso!

Bjoks!



http://garotapendurada.blogspot.com/

ED CAVALCANTE disse...
10 de novembro de 2008 às 15:48

Bete, sei que Ariano é GRANDE, aliás, ressalto isso no post. Entretanto, temos que dar nomes aos bois,quero saber quem escreveu os cordéis.
Bia, tenho 43 anos, o episódio em que eu fui expulso da sala aconteceu em 1979, época difícil para se discordar do mestre. Liberdade vigiada era coisa comum na escola setentista. Obrigado pela visita!

@HUGOCEREGATO disse...
10 de novembro de 2008 às 21:30

HAHAHAHAHAHAHA! Não sei muito sobre, até pq não gosto muito da cultura nordestina, nem sequer me lembro direito do filme, masss... se vc falou, tá falado. RS!

E respondendo. O meu blog foi criado no intuito de colocar fragmentos de livros, e fragmentos de livros meus (imaginários). Mas por enquanto o blog só tem trechos meus, não achei em livros algo que me fizesse postar lá.

Adm disse...
10 de novembro de 2008 às 21:31

Ariano é foda, adorei assistir a miniserie sobre ele e ir na esposição sobre a tal!!
abrçs

10 de novembro de 2008 às 21:34

Nossa.... acho que a liberdade de expressao é fundamental, acho que existem formas diferentes de escrever as mesmas coisas, mas nao costumo "criticar" os grandes mestres... se é que voce me entende?

rsrs...

http://nelinhalokinha.blogspot.com

10 de novembro de 2008 às 21:46

Para mim a questão é a seguinte: qualquer outro q tivesse feito essa adaptação teria apaixonado os leitores como fez Ariano?

A genialidade dele está em recriar, dando tal vida aos personagens, que os fez imortais.

10 de novembro de 2008 às 21:52

ahauahauahauahauahau
essa foi boa, Ed!! [seu comentário lá no facetas]

Se o texto não tem autor então eu não existo, hauahauahauahaua

um beijo grande
ellen regina
www.facetasdemim.blogspot.com

ED CAVALCANTE disse...
10 de novembro de 2008 às 22:04

Ellen,não quastiono a genialidade do Ariano. A questão é o anonimato dos (também geniais) cordelistas.

10 de novembro de 2008 às 22:14

Sem problemas, Ed, inicialmente eu havia pensado q fosse piada mesmo, hauahauahaaua.

Me desculpe!
ellen regina

Bete Meira disse...
10 de novembro de 2008 às 23:08

Ed,eu sei que você sabe que o professor Ariano é GRANDE!E falei que concordo c vc,os autores devem ser citados,certamente,é questão de justiça. Pq será que Hugo não gosta da nossa cultura que é tão rica?Vc relutou em publicar essa postagem temendo "ser apedrejado",mas parece que se enganou,felizmente.Temos que ter maturidade para uma "discussão" equilibrada,que fique no nível das idéias,sem ofensas e agressões.È admirável a troca de experiências,aprendemos com isso.Liberdade de expressão é a chave da convivência respeitosa.Também achei absurda a atitude do seu querido prof Felinto,vc sabe que somos contemporâneos,mas talvez por ser muito calada,não me lembro dessa liberdade vigiada,quem sabe eu não "representasse perigo" como vc,eheheheh...

Anônimo disse...
28 de novembro de 2008 às 17:43

Gostei muito do blog

Devo dizer que naum sabia quais cordeis ele havia adptado para sua obra tão famosa.( O auto da Compadecida). Mas ja li a respeito das adaptações de Ariano e sabia que ele havia retirado essa história da literatura de Cordel.
Sei também que esta atitude dele se enquadra na concepção do historiador francês Roger Chatier. Este fala que a cultura popular sofre uma apropriação e posteriormente uma reprodução. Ambos feitos pelo autor. No caso do auto da compadecida podemos encontrar tudo isso. Existe tanto um como o outro. Para se ter uma idéia, João Grilo na literatura de Cordel é um dos 4 amarelinhos( que sinceramente não lembro o nome deles). Os amarelinhos eram espertalhões uqe passavam a perna em todo mundo.

Abraço

sandra disse...
21 de outubro de 2009 às 13:54

Amigos, o que ocorre na obra Auto da Compadecida, bem como com o personagem João Grilo, é um processo de apropriação e renovação. Basta lerem o comentário final no livro q entederam. A vida já é por demais conturbada p se apegar a coisas insignificantes. Ler a obra de Ariano é se deleitar num texto engraçado. Se vcs têm liberdade de expressão ele, Ariano, tem de criação...apropriação... renovação.

ED CAVALCANTE disse...
21 de outubro de 2009 às 23:07

Sandra, eu não estou tirando o direito do Ariano adaptar, estou questionando o fato de charem um adaptador de escritor. Acho uma sacanagem os artistas populares criadores do cordeis que deram origem ao "Auto da Compadecida" não serem conhecidos!

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