Quando
eu era garoto, lá pelos dez, doze anos, perto da minha casa morava uma velhinha
muito sinistra chamada “Dona Sofia”, na vizinhança - entre as crianças - rezava a lenda de que ela
havia morrido há anos e aquela “pessoa” que víamos, vez ou outra, bisbilhotando
a rua pela janela, era uma morta-viva. Morria de medo dela.
Certa
vez, quando vinha da escola junto com minha mãe, ela parou para conversar com
dona Sofia. Nesse dia pude observar detalhes esquisitos dela uma
pele tão branca que as veias, roxas como vinho, desenhavam o corpo, era um ser quase
translúcido. O pior de tudo foi quando ela sorriu pra mim e pegou no rosto, que
mão fria. Desse dia em diante tive
certeza absoluta que ela era mesmo uma morta-viva. Até que num belo dia meu pai
chegou com a notícia da morte dela.
Disse, em tom de piada: “Dona Sofia morreu de novo”.
As
crianças enxergam as coisas de uma forma diferente dos adultos. Os pequenos
detalhes ganham tons superlativos e acabam enriquecendo as histórias. Um amigo
meu, Stenio – infelizmente perdi o contato com ele – acreditava que entre as
pedrinhas que sua mãe catava no feijão tinha pedras preciosas, ele guardava todas e eu acabei pegando esse vício também.
O tempo passou, crescemos, e restaram apenas um saco de pedrinhas e o lirismo
dessa história.
Outra
historinha legal, essa, protagonizada pelo meu amigo Mozart. Ele “criava”,
vejam só, um seixo, dentro de um tonel. Todos os dias jogava na água um
punhado de sal que, segundo ele, fazia a pedrinha crescer. Vários garotos
acreditaram nessa lenda e também passaram a “criar” pedrinhas. Sempre que nos encontramos na rua, lembramos
dessa hilária história.
O
mundo da criança tem uma realidade fantástica.
Eu, por exemplo, lá pelos sete, oito anos, quando chegava o dia do meu
aniversário ficava horas na frente do espelho pra ver o momento que eu
começaria a crescer. Lembro-me que
durante um longo tempo cultivei a ilusão de que havia visto meu crescimento dos sete
para os oito anos.
Pra
finalizar esse breve post, deixo um ensinamento do meu tio Janja, passado de
boca em boca, na minha família. Questionado por sua mãe porque acordava tarde e
dormia muito, ele, um garoto esperto, saiu com essa: “Mãe, eu não durmo muito,
é que eu durmo devagar aí acordo tarde”.